Filha do abraço do mar com o Rio Jaguaribe, Aracati foi no passado (e ainda é no presente) a porta de entrada do Ceará em busca do Sertão, assim como o ponto de partida da velha Ribeira do Icó, estrada principal da colonização e do povoamento mais ou menos regular da hinterlândia cearense.
E quando no Ceará a Liberdade e a República se fizeram uma realidade concreta contra a opressão imperial, foi em Aracati que os homens de Tristão Gonçalves edificaram a Capital da Província, instalando ali a sede da Confederação do Equador, quiçá a maior de todas as nossas ousadias políticas e o mais heróico de todos os nossos movimentos históricos.
Possui Aracati, assim, um dos nossos mais arrojados patrimônios, não sobretudo histórico, tão-somente, mais fundamentalmente cultural e arquitetônico: o recorte centenário de suas Igrejas e de seus Casarões, às vezes os beirais e cornijas de suas fachadas, às vezes os lambris e os jacarés de suas austeras residências.
Tudo, no entanto, com exceção talvez de um outro caso, se vai morrendo à míngua dos olhos omissos e quase totalmente cegos dos poderes públicos de Aracati e da Secretaria de Cultura do Estado, pois em Aracati o patrimônio que se vai tombando, se vai igualmente abandonando à corrosão do tempo e da história.
E como dói, em mim, sentir Aracati e não poder falar. E como dói, em mim, rever Aracati e ver desmoronar a Casa-Monumento onde Adolfo Caminha nasceu, ele que foi e que é o maior de todos os seus filhos. E justamente ele que a cada dia, mais e mais, firma-se como um dos grandes escritores do Brasil, e como glória cultural, também, da nossa côrte literária no Exterior.
Não. Não quero acreditar que os poderes públicos de Aracati, que a cidadania ativa de Aracati, que os homens de boa vontade de Aracati, que a Secretaria de Cultura do Estado e que o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional deixarão criminosamente ruir a residência onde o escritor Adolfo Caminha nasceu.
E Aracati, o que fez (ou o que faz agora) para preservar a casa onde Adolfo Caminha nasceu ou para restaurar o patrimônio histórico que lhe é afeto? E quem, na Prefeitura de Aracati ou na Secretaria de Cultura do Estado, se sente incomodado (ou provocado) a responder a esse desafio?