De todos os filhos do Cel. Figueiredo, o menor e mais desprovido de carne era o Bruno que, ainda adolescente, recebeu o apelido de "Major" (que, em inglês, significa maior). O apelido "pegou" de tal maneira que, mesmo depois de adulto e casado, ninguém o chamava de seu Bruno ou Sr. Bruno, mas simplesmente Major Bruno, o apelido sempre grudado ao nome. Essa é a versão da família; porém, há uma outra, registrada no livreto "Aracati e Seus Tipos Populares", de Josias Correia Barbosa, em 1943.
ALCUNHA: MAJOR
Josias conta, com riqueza de detalhes, como o pedinte conhecido por Cabra Homem, que na juventude fora militar, exigia esmola de maneira autoritária, chamava as pessoas ricas pelo nome e sempre com uma patente de oficial. Exemplifica, contando que quando Cabra Homem chegava na loja de seu pai, gritava alto: "Major Correia, minha esmola!" Diz Josias: "Foi por esse tempo que começou a batizar com o nome de Major Bruno o então Bruno Porto da Silva Figueiredo. Se não fora Cabra Homem, o nosso estimado Major Bruno não teria ganho a patente, pela qual hoje é conhecido".
A meu ver, uma versão não invalida a outra, se o fato aconteceu simultaneamente: Cabra Homem pode ter ouvido alguém da família chamando-o de Major Bruno ou a família ouvido o mendigo e, por zombaria, o "batizou" com aquela patente. O certo é que a patente o acompanhou até morrer. A bem da verdade, é bom que se diga, jamais alguém disse ter notado algum constrangimento ou aborrecimento do Bruno por causa daquele título antes do nome. Muito ao contrário, os amigos só o chamavam Major. Simplesmente Major, ao que ele prontamente atendia.
MAJOR E PREFEITO
Quando prefeito do Aracati no período de 1922 a 1926, criou uma escola municipal, por acreditar que somente a educação com boa instrução melhoraria o nível social e financeiro do aracatiense. Assim pensando, procurou contratar os melhores professores de Fortaleza, levando-os para morar no Aracati. Para diretor, foi contratado o Professor Joaquim Moreira de Souza que, anos depois, foi secretário da Secretaria de Educação do Estado. Era irmão do Dr. Francisco Moreira de Souza, saudoso médico e fundador do Náutico Atlético Cearense.
Major Bruno possuía salina no distrito Icapuí, hoje município, e sempre que lá ia, a cavalo, tomava por uma "estrada" natural que, saindo da cidade, passava pela várzea, seguia pelo lugar conhecido por Córrego dos Rodrigues, subia as dunas, descia para a praia e continuava até Icapuí, quando a maré estava baixa. Com a maré alta não havia como chegar lá, por falta de estradas. A única opção era a praia/estrada.
Certo dia, o Major procurou saber de quem eram aquelas terras e as dunas que ele atravessava quando ia a Icapuí. Depois de tomar conhecimento sobre quem era o dono, procurou-o e comprou as ditas terras e dunas por dois contos de réis (hoje seriam dois mil reais???). Pagou e tomou posse. Logo depois, ao tentar passar as escrituras no cartório, ficou sabendo que não podia fazê-Io por falta de inventário de duas gerações de herdeiros. Todavia, o Major Bruno ficou com a posse da terra e era tido como dono. Como se diz, foi uma posse mansa e pacífica.
Hoje, as terras então adquiridas são conhecidas nacionalmente por Majorlândia, nome dado pelos amigos do Major Bruno, que significa "Terra do Major".
A MALÁRIA EM ARACATI
Em 1936 ou 1937, grassou uma epidemia de malária na cidade de Aracati, tendo como vetor um inseto pernilongo, o anófeles, de hábitos noturnos, que o aracatiense chamava de muriçoca. O Major, que havia construído uma grande casa de praia em sua propriedade de nome Majorlândia, com tantos quartos quantos eram os seus filhos, levou a família para lá. Muitos amigos do Major também queriam ficar fora da cidade, por medo da doença e ele, que tinha o coração maior que o corpo, foi autorizando que construísse, cada um, uma casa na sua Majorlândia.
Com a epidemia aumentando, o Instituto Oswaldo Cruz, de Manguinhos, com sede no Rio de Janeiro, então Capital do País, mandou uma equipe de técnicos ao Aracati, para coordenar o combate ao mosquito vetor do Plasmodium, protozoário causador da doença. Os hábitos e ciclo biológico do mosquito haviam sido estudados pelo fundador da instituição. Também foram vários técnicos americanos, com verbas especiais para ajudar a debelar aquele surto epidêmico e treinar as técnicas de combate ao mosquito e a doença. Conseguiram, a muito custo, acabar com os pernilongos, enquanto as pessoas doentes recebiam quinino para se curarem. O quinino era o único remédio, na época, para matar o protozoário que causa a malária. Essa doença era também chamada de sezão ou de impaludismo, por pensarem ter origem nas águas poluídas dos lagos, até Oswaldo Cruz esclarecer o problema.
As famílias que construíram casa na Majorlândia para se protegerem da malária, pela manhã voltavam à cidade para trabalhar ou levar os estudantes às aulas. Ao fim da tarde iam para Majorlândia, onde dormiam tranquilos.
NASCIA MAJORLÂNDIA
Acabado o surto epidêmico todos, inclusive o Major Bruno, retornaram à vida normal da cidade, mas nos fins-de-semana e feriados, todas as casas eram ocupadas e muitos iam lá, mesmo sem abrigo, para tomarem banhos de mar. Major Bruno constatou que, com muitas casas, se tornaram mais agradáveis os períodos de férias e fins-de-semana, não só para ele, que tinha amigos para conversar, mas também para seus familiares. E as autorizações do Major continuaram...
Nascia, assim, a Majorlândia como hoje a conhecemos, um povoado de médio porte, com dezenas de ruas e uma grande população, sendo uma parte de residentes fixos e outra ocasional.
Fonte: Fernandes, Leônidas Cavalcante. Aracati: o que pouca gente sabe. Rio — São Paulo — Fortaleza: ABC Editora, 2006.