Aracati

Sunday, 19 February 2012 15:49

DIVERSIDADE CULTURAL

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Carnaval de Aracati em 1930 Carnaval de Aracati em 1930

Destaque como referência no Carnaval do estado do Ceará, Aracati busca retomar o elo com suas origens culturais. Nos últimos anos, os cidadãos da nossa histórica cidade buscaram os tradicionais blocos, além de programas para a família, onde as crianças têm mais liberdade e segurança para brincar e voltaram a incluir no seu repertório as famosas marchinhas de carnaval. 

Não é de hoje que Aracati possui um carnaval de destaque. Aliás, apesar da grande publicidade feita pela mídia, atualmente, quem conheceu o carnaval dos anos passados sabe que a diversidade cultural era bem maior e a criatividade sempre foi a tônica de um bom folião aracatiense. 

Cresci ouvindo falar do Chico de Janes, que encantava a todos com a sua versatilidade, gerando na população uma grande expectativa quanto às fantasias que iria utilizar durante o carnaval. Foi um artista da criatividade e do encantamento. 
 
Na região em que cresci, Centro da cidade/Praça D. Luís (popularmente chamada de Praça da Coluna), recordo-me com precisa nitidez a figura do “Barra de Aço”, também chamado de Zé Balduíno. Acredito que tenha sido o folião mais característico. Sua vida era um constante carnaval, levando alegria e diversão pelas ruas do Aracati. Ficava encantada ao ver aquele senhor encarnando diversas personagens, durante os festejos carnavalescos. Lembro que foi ele que me encheu os olhos infantis de alegria quando vi, pela primeira vez, um boi dançando na Rua Grande, manipulado por um jovem agachado em seu interior. O brinquedo era composto de matéria simples: uma armação de madeira coberta por um tecido barato, pintado de preto e branco (as cores d’O Caveira, bloco que fundou). Mas a simplicidade, a espontaneidade e a alegria daquele momento o tornaram eterno. 

Do inesquecível Barra de Aço guardo a primorosa lembrança de ouvi-lo cantar, acompanhado de sua inseparável cuíca, na mercearia do meu avô, a Casa Ponciano. Entre uma pinga e outra, o saudoso amigo molhava o pano da cuíca na pia, ao lado do balcão. Sua voz rouca revelava inesquecíveis canções da nossa música popular e, é claro, os sambas-enredo d’O Caveira. Decididamente, para Barra de Aço o carnaval durava o ano inteiro. Este homem humilde encantou os dias de minha infância e faço questão de dizer que guardarei para sempre, e de modo todo especial, a sua passagem pela minha vida. Ele me ensinou, sobretudo, que a juventude e a alegria constituem uma conquista diária, uma proposta de vida. 
 
Um terceiro nome importante na história do carnaval aracatiense é Nogueira Ponciano. Amante da arte, da cultura e da alegria, criou diversos blocos (Prova de Amor, Lampião e seus Cangaceiros, Bambas da Orgia, Garotas de Frevo e outros), fundou o Clube 7 de Setembro, organizou e apresentou durante muitos anos o Pastoril e colocou nas ruas da cidade o famoso Zé Pereira. 

No Brasil, o criador dessa manifestação popular foi o sapateiro português José Nogueira de Azevedo Paredes. Segundo pesquisadores, foi ele o introdutor, em 1846, do hábito de animar a folia ao som de tambores, em passeatas pelas ruas, chamando o povo para brincar o carnaval. 

Em Aracati, Nogueira Ponciano deu continuidade à tradição de origem portuguesa, atravessando o Centro Histórico da cidade, iluminando as ruas com lamparinas e espalhando alegria por onde passava, durante o Sábado Magro. Como não vivi essa época, minhas memórias são fruto do registro fotográfico e de pesquisas e conversas com pessoas que prazerosamente narram os festejos. 

Passado algum tempo e durante muitos anos, o Zé Pereira deixou de acontecer no carnaval de Aracati. Em 2007, entretanto, familiares de Nogueira Ponciano decidiram homenageá-lo, colocando de volta nas históricas ruas da cidade, aquilo que o inesquecível folião sabia fazer tão bem. Desde então, o carnaval ficou mais alegre e grandioso, iluminado pelas tochas e embalado pela música do Zé Pereira. 

De tudo, resta-nos, além da satisfação de ver retornar a espontaneidade dessa manifestação popular, a oportunidade de inserir na festa os foliões saturados da exaustiva repetição do repertório de axé e forró que, decididamente, se distancia cada vez mais das origens do carnaval aracatiense. Que ele exista, porque assim também se constituiu ao longo dos anos, mas que não seja único porque o que caracteriza o carnaval é a diversidade. 

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Rosângela Ponciano

Rosângela Ponciano é professora, cantora, poetisa, membro da Academia Tauaense de Letras e cofundadora da Associação Cultural Solar das Clotildes.

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Sobre nós

O Grupo Lua Cheia, com sede na cidade de Aracati-CE, é um coletivo de artistas formado em 1990 com o objetivo de fomentar, divulgar e pesquisar a arte e a cultura.