Na Vila de Santa Cruz do Aracati (atual cidade de Aracati), a Câmara Municipal sempre esteve atenta aos problemas locais. Documentos históricos dão conta da atuação desses "homens bons" que procuravam regulamentar o uso e ocupação do solo urbano no referido período. Assim, procuravam inibir as práticas econômicas que colocavam em risco a natureza e a própria saúde da população.
Um dos problemas ambientais ocorrido no século XVIII se refere ao assoreamento do rio Jaguaribe. Além das ações naturais como os ventos, as correntes oceânicas, que impeliam os bancos de areia para a sua foz, obstruindo os canais de entrada dos navios e barcos, outras atividades, como por exemplo, os currais de pescaria contribuíam para estreitar o leito do rio.
Em uma Ata da Câmara, datada em lº de setembro de 1785, o vereador Antônio Pereira de Carvalho, se opôs a que o senado da Câmara concedesse licença para levantar currais de peixe no rio Jaguaribe, sob a alegação de que tais currais estavam obstruindo o leito do rio.
A Câmara também se fez presente quando da implantação das charqueadas. Conforme consta no Auto da Audiência Geral de 12 de fevereiro de 1781, a Câmara Municipal exigiu a retirada das oficinas de carne (charqueadas) da rua central, como forma de aliviar a população dos incômodos provocados pelas oficinas. Alegavam ainda que as oficinas estavam "desfigurando a beleza e arruinando a saúde pública desta Vila". O local indicado pela Câmara para instalar as oficinas deveria ficar no terreno que ia da "Oficina do Salvador", próximo à Ilha dos Veados, por ficar mais próximo do ancoradouro dos barcos e mais distante das ruas principais da Vila.
Diante do que foi exposto, podemos entender agora porque os primeiros filhos da "terra aracatiense" eram considerados, na época, segundo o historiador João Brígido, "a gente mais civilizada do Ceará. Um homem do Aracati, por isto só que era do Aracati, podia meter a cara em qualquer negócio, e colocava-se no primeiro plano em toda parte onde chegava".
A preocupação com o meio ambiente, numa época de tão poucos recursos, mostra como os primeiros aracatienses, do ponto de vista da consciência ambiental, estavam muito à frente de sua época. O que diriam os "homens bons" diante da devastação das nossas matas ciliares (os carnaubais em especial) e poluição das águas do rio em nome do crescimento econômico proveniente da carcinicultura (criação de camarão em cativeiro)? O que fariam os "homens bons" diante da inércia desta sociedade dita "civilizada"?
Maria Edivani Silva Barbosa
Mestra em Geografia pela Universidade Estadual do Ceará (UECE). Professora substituta do curso de geografia da Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos (FAFIDAM/UECE) em Limoeiro do Norte-CE.
Fonte: Informativo do Centro Aracatiense. Ano VII- Nº XXVII - Outubro - Novembro - Dezembro de 2006.