Arte

Sunday, 20 December 2015 12:54

ENTREVISTA | FABIANO BARROS: ARTE E PERFORMANCE

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Fabiano Barros Fabiano Barros Acervo do artista.

Escultura, fotografia, performance são algumas das linguagens utilizadas pelo multiartista aracatiense Fabiano Barros. Fabiano reside atualmente na cidade de Manaus onde desenvolve seus trabalhos. Em entrevista, ele nos fala sobre suas ações como artista visual e performer. 

MARCIANO PONCIANO- Quais os caminhos percorridos por Fabiano Barros? 

FABIANO BARROS- Comecei com desenhos de peixes que fazia na infância quando ia passar os finais de semana na casa do meu pai, na praia. Lá, com meus irmãos mais velhos que já desenvolviam o trabalho com areia colorida, eu encontrava estímulo pra desenhar ao som dos vinis que tocavam no bar do meu pai. 

Fui desenvolvendo desenhos e capas de trabalho escolares, cartazes e painéis para festivais; foi quando frequentei o ateliê do artista Hélio Santos e me deparei com um mundo de possibilidades. 

Em um curso de máscaras ocorrido durante as férias, em Aracati, descobri que também gostava de escultura. Desenvolvi uma escultura com sucatas de bicicleta para a primeira exposição pública que participei, criada pelo grupo “Lua Cheia de Teatro” e que aconteceu no adro da Igreja Matriz de Aracati. 

Chegando a Manaus conheci artistas, participei de cursos de pintura e coletivas. Ingressei em curso superior e resgatei minhas influências teatrais e, assim comecei a estudar performance, sem acompanhamento de professores, mas em parceria com outro artista baiano que estudava comigo e que me fez reconhecer minhas raízes nesse processo. 

  

MP- Qual o lugar da arte performática? 

FB- A performance ocupa o lugar das artes questionadoras, que afronta e quebra os nossos modelos de comportamento humano, pois o corpo é o suporte e ponto de partida pra essas questões latentes. 

A performance ocupou um lugar de destaque em meu processo criativo. Ela é um conjunto de influências e tem sua origem quando eu fazia a educação básica no Instituto São José. Ali eu assistia apresentações do festival mariano... Começa quando eu entrei no grupo Lua Cheia de Teatro que desenvolvia trabalho de corpo com os atores. Percebendo que eu tinha grande limitação com a fala e optei por investigar muito mais a expressão corporal. 

  

Quando estava em Aracati, quis ir ao mercado e levar uma bacia com água, abordar as pessoas e pedir pra lavar seus pés...

MP- Na arte performática, qual é a fronteira entre obra e artista? Ela existe? 

FB- Essa fronteira inexiste para alguns. Para mim ela é uma linha muito fina, uma vez que o corpo do artista torna-se o suporte principal desta linguagem artística. Existe uma doação do performer à sua arte, uma entrega absoluta. Diferente do ator, o performer não interpreta um personagem, mas está em cena como tal. 

  

MP- A arte performática é efêmera e necessita de outras linguagens, fotografia e/ou vídeo, para registrar o instante. Assume, portanto, dois estágios. Que proposições emergem desses dois instantes? 

FB- No momento da performance a referência pode ser teatral, mesmo não sendo teatro, até ritualística e xamânica. O performer torna-se vértice daquele acontecimento, ele não interpreta, mas está em um outro estado corporal e energético. 

  

MP- Em muitos trabalhos que tem realizado você participa como convidado, em projetos realizados por outros artistas. Como se dá esse diálogo? 

FB- Artistas entram em contato quando vão fazer lançamentos ou aberturas de exposição, por exemplo. Então começo a perguntar sobre eventos que promovem, sobre o conteúdo, sobre o formato geral que este quer dar, sobre como ele mesmo imagina meu trabalho interagindo com o dele. A partir dai preciso visitar o espaço onde acontecerá a performance para poder pensar, praticamente, como pode se dar a intervenção- pois venho dos ateliês e de processos manuais. Preciso pensar como vai ser montado, de que material e quanto tempo levaremos para isso... 

  

MP- Recentemente você participou de uma performance que teve como inspiração o desastre ambiental ocorrido em Mariana-MG.  

FB- Chamamos este processo de inquietações. 

  

MP- Fale-nos sobre o trabalho desenvolvido com a técnica monotipia. 

FB- A monotipia foi uma das técnicas que aprendi no curso de artes que conclui em Manaus. Estudando xilogravura, com o professor e artista Otoni Mesquita, fui absorvendo cada passo dessa arte. Na monotipia tive a chance de evoluir para além dos exercícios que o professor havia passado. Ao final, estava realizando impressão em camisetas e outros suportes, utilizando folhas de árvores e arbustos que se encontram com muita facilidade nas florestas que rodeiam a cidade. 

  

MP- Quais são as outras faces de sua obra? 

FB- Do desenho à performance. Hoje, vejo meu processo escoando pelo audiovisual. Não faço uma só ação que não veja se transformar em foto ou vídeo. Não faço esforço pra isso, mas vejo que as ferramentas do nosso tempo propiciam essa característica que já foi absorvida por vários artistas da nossa contemporaneidade.

O homem contemporâneo precisa refletir mais sobre seu comportamento, sobre ser levado pelo mundo que a televisão vende, por exemplo. 

  

MP- Aracati, no Ceará, está repleta de antagonismos culturais. Qual tema motivaria uma performance sobre sua cidade natal? 

FB- Quando estava em Aracati, quis ir ao mercado e levar uma bacia com água, abordar as pessoas e pedir pra lavar seus pés... Pois vejo um povo muito devoto do cristianismo, mas nem tanto humilde... Também tenho uma coleção de fotografias de todas as portas dos casarões da rua grande, pretendo realizar algo com isso, mas ainda não consegui fechar a ideia. Apenas germinei um nome pra isso, chamo-o de “portas do tempo”. Vejo muitas possibilidades para o Aracati, na sua política, na sua geografia, na sua história. Há muitos temas conflitantes que merecem ser abordados.  Mas a comunidade também precisa buscar a consciência disso, do contrário o artista, sozinho, parecerá um louco falando de coisas que as pessoas não acordaram. Isso pode ser um abismo... 

  

MP- A arte é ponto de partida ou de chegada? 

FB- Dependendo de onde se olha... 

Uma obra artística madura ou lapidada pode ser o ponto onde cada artista anseia chegar, no entanto, quando apresentada ao público essa obra pode ser o início de uma reflexão profunda.  

O homem contemporâneo precisa refletir mais sobre seu comportamento, sobre ser levado pelo mundo que a televisão vende, por exemplo. Sobre nossa realidade e sobre nossa função aqui. Prefiro olhar a arte como ponto de partida, como a ferramenta que podemos utilizar pra falar o que quisermos, no entanto eis aí o peso da responsabilidade: existe muita arte banalizada. 

Isso é uma reflexão, que enquanto artista trago e procuro transmitir. Não é ponto de partida nem de chegada. Ela é. O fenômeno acontece de uma inquietação... Como força transformadora de realidades. 


Entrevista cedida por Fabiano Barros a Marciano Ponciano no dia 20 de dezembro de 2015. 

  

INQUIETAÇÕES 

 

Performance: Alan Panteon, Fabiano Barros e Odacy - Um trabalho desenvolvido pelos artistas às causas catastróficas que vem acontecendo no Brasil. Manaus - AM - Brasil Fotos : Tácio Melo 

  

PERSONAS 

 

Laboratório desenvolvido tendo como base as criaturas mitológicas do artista Otoni Moreira de Mesquita. Registro fotográfico de Ewerton Pinheiro e tratamento de imagens de Fabiano Barros. 

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Marciano Ponciano

MARCIANO PONCIANO- Sou natural de Aracati-Ce, terra onde os bons ventos sopram. Na academia da vida constitui-me poeta, realizador de sonhos, encenador de máscaras. Na academia dos saberes acumulados titulei-me professor de Língua Portuguesa e especializei-me em Arte-Educação. O projeto de vida é semear a arte por onde passe: teatro, poesia, artes plásticas- frutos da experiência acumulada em anos dedicados a ser feliz. Quando me perguntam quem sou - ator, poeta, encenador, artista plástico, educador? Afirmo: - Sou poeta!

Publicou:

Poetossíntese. Coletânea de poemas. Ed. própria. Aracati-CE. 1996.

Caderno de Literatura Poetossíntese. Coletânea de poemas. Ed. Terra Aracatiense. Aracati-CE. 2006.

aracaty. Cadernos de Teatro. Ed. Terra Aracatiense. Aracati-CE. 2010.

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Sobre nós

O Grupo Lua Cheia, com sede na cidade de Aracati-CE, é um coletivo de artistas formado em 1990 com o objetivo de fomentar, divulgar e pesquisar a arte e a cultura.