Marciano Ponciano- Aracati foi contemplada em 2013 com recursos do PAC-Cidades Históricas, entre os benefícios está o projeto do Cineteatro Francisca Clotilde. O que de fato será realizado neste projeto?
Ramiro Teles- Serão executados serviços integrais de restauro, requalificação e adaptação do imóvel às funções de cineteatro. Com isto, a sala de espetáculos será dotada de caixa cênica, inexistente desde sua origem; plateia com curva de visibilidade garantida; bateria de sanitários; eliminação de anexos espúrios e recomposição de características originais. Acessibilidade universal foi outra diretriz do projeto que garantirá o acesso pleno aos usuários.
Marciano- O projeto do teatro consta do esforço e articulação da sociedade civil organizada, órgãos públicos entre eles o IPHAN. Este percurso remonta o ano de 2007 quando foi lançada a campanha “O Espetáculo não pode parar”. Sete longos anos separam aquela ação da conquista de recursos públicos para a requalificação do citado espaço. Por que este processo é tão lento?
Ramiro- De fato, o embrião de tudo foi a campanha “O Espetáculo não pode parar”. Com ela houve a sensibilização do poder público municipal e do IPHAN-Ceará. A partir daí, através de compromisso firmado junto ao Ministério Público Estadual, coube ao IPHAN a elaboração do projeto de restauro e à municipalidade a desapropriação do imóvel e elaboração dos projetos complementares. Desde a firmatura do compromisso o IPHAN vem cumprindo o que foi estabelecido e iniciou a elaboração do anteprojeto de restauro no âmbito da Superintendência. Concluído o anteprojeto, foi solicitado ao IPHAN-Sede o recurso para a contratação do projeto executivo de restauro. Após um ano de elaboração de projeto, os esforços se direcionaram no sentido de captar o recurso e o IPHAN tomou esta dianteira. Durante o anúncio do PAC Cidades Históricas o IPHAN-CE, em sintonia com a Prefeitura Municipal de Aracati, candidatou esta ação como prioritária para Aracati. Em agosto de 2013 a Presidenta Dilma anunciou as ações contempladas para todas as cidades candidatas e Aracati foi contemplada com mais de 8 milhões de reais para diversas obras de restauro, tendo o Teatro Francisca Clotilde como ação piloto. Todo este percurso descrito está imbricado de prazos, procedimentos e trâmites burocráticos dos quais não podemos nos eximir. Eis o motivo da aparente demora.
Marciano- O teatro, certamente, cumprirá além de suas funções enquanto equipamento cultural, um papel importantíssimo para a revitalização do centro histórico de Aracati. Qual a importância da educação patrimonial e do sentimento de pertença para a sustentabilidade dos sítios históricos, em especial o de Aracati?
Ramiro- O Teatro restaurado dará fôlego novo ao corredor tombado do sítio histórico. Será a força-motriz de um venturoso processo de requalificação que se instaura em Aracati no último ano. Além de todas as ações em vista – PAC Cidades Históricas, Financiamento de Imóveis Privados a juro zero – acreditamos que a educação é um dos pilares para a dinamização e qualificação de todo este processo, devendo permeá-lo. Através dela os olhares tornam-se mais límpidos e aguçados, a aproximações e vinculação ao patrimônio cultural tornam-se mais evidentes e a partir disto garante-se a preservação daquilo que é objeto de proteção e a consolidação das ações tão arduamente conseguidas. A educação transforma, enriquece e sustenta.
Marciano- Todo atentado ao patrimônio histórico configura-se um desconhecimento da história e dos marcos legais?
Ramiro- Não necessariamente. Cada caso é um caso. Quero crer que atualmente poucos destes atentados ocorrem por desconhecimento dos marcos legais. Felizmente a defesa do patrimônio cultural já é um assunto que permeia o cotidiano dos aracatienses. É importante ressaltar também que estes eventuais atentados praticamente não mais ocorrem.
Marciano- Por que é tão difícil convencer as pessoas sobre a importância da preservação de bens históricos? Como poderemos reverter essa postura?
Ramiro- O acesso ao patrimônio cultural é um direito difuso, coletivo, garantido pela Carta Magna. No caso do patrimônio edificado, um dos mais simbólicos por sua concretude, há que se observar a existência de uma relativa limitação do direito de propriedade. Não se pode dispor dos imóveis deliberadamente, em termos de alterações de suas características, sem prévia autorização do IPHAN e isto é o ponto que gera divergências. Porém, o Decreto-Lei 25/37 delega ao IPHAN esta responsabilidade de fiscalização, o que vem sendo cumprido desde o ano 2000 quando o Sítio Histórico de Aracati foi tombado. A chave de todo o processo de aproximação e defesa da preservação reside na educação e sensibilização dos usuários, sejam moradores, proprietários ou visitantes.
Marciano- Os materiais produzidos pelo IPHAN sobre o patrimônio histórico de Aracati, disponíveis em cartilhas, apresenta um texto muito técnico, baseado muitas vezes em difundir leis e normas sobre os bens tombados. O IPHAN trabalha em algum projeto editorial que apresente uma proposta mais didática?
Ramiro- Sim. Desde que o sítio histórico de Aracati foi acautelado o IPHAN tem estado presente mensalmente na cidade seja através de fiscalização de rotina, palestras, oficinas. Além disto, diversas cartilhas educativas têm sido distribuídas à população residente no sítio histórico bem como material de divulgação deste patrimônio: panfletos, cartões-postais, etc. Além destas iniciativas o IPHAN publicou, em parceria com a Fundação Demócrito Rocha e com a Secretaria de Educação do Ceará, a coleção Infância de Patrimônio com o livro didático “Construindo Aracati” voltado ao Ensino Fundamental I que foi repassado à Prefeitura Municipal de Aracati para distribuição às escolas municipais numa tiragem de cerca de 3 mil exemplares. Os professores também participaram de um treinamento para orientá-los quanto ao uso do material na grade curricular das escolas.
Marciano- Aracati configura-se como uma cidade que se destaca pelo seu patrimônio imaterial entre os quais músicos, artistas visuais, atores, etc. Este cenário foi uma das justificativas para a inclusão do teatro como prioridade entre as obras a serem efetivadas com recursos federais. No mês de março celebra-se o dia internacional do teatro uma data oportuna para o início das obras no Cineteatro Francisca Clotilde. Objetivamente quando terá início a obra e qual será o prazo previsto para o seu término?
Ramiro- Desde o anúncio das ações contempladas no PAC Cidades Históricas, em agosto de 2013, a Superintendência do IPHAN no Ceará vem trabalhando na adequação dos projetos e orçamentos de acordo com as orientações da Diretoria do PAC Cidades Históricas. Na última semana recebemos a aprovação final de todo o material enviado. Com isto, durante o mês de março solicitaremos a descentralização do recurso, já garantido, para que possamos licitar a obra durante o mês de abril. Imaginamos que as obras iniciarão ainda no primeiro semestre (2014).
Entrevista cedida via e-mail por Ramiro Teles, Superintendente do IPHAN no Ceará, à Marciano Ponciano para o site www.luacheia.art.br, em 16 de março de 2014.